O acréscimo de 0,23% nos custos suportados pelo Estado com a diálise está relacionado com o aumento do número de doentes e da sua esperança média de vida, graças à qualidade dos serviços prestados.
O mais recente relatório Informação de Monitorização sobre o Setor Convencionado de Hemodiálise, da responsabilidade da Entidade Reguladora da Saúde (ERS), reflete uma avaliação objetiva de indicadores qualidade clínica, acessibilidade e proximidade, estrutura de mercado, e cumprimento das metas definidas pela DGS , mas deixa de fora algo substancialmente relevante: o contexto em Portugal e o impacto real que a diálise tem na vida daqueles que dela necessitam.
Quando o documento refere o acréscimo de 0,23% nos custos associados à diálise face a 2023, não especifica que este valor está diretamente relacionado com o aumento do número de doentes que necessitam deste tratamento vital e da esperança média de vida que, graças à qualidade dos serviços prestados, tem vindo a aumentar de ano para ano. Atualmente a doença renal crónica afeta cerca de 10% da população adulta portuguesa sendo que os últimos estudos científicos apontam para que, dentro de uma década, esta patologia seja a quinta maior causa de morte em Portugal. Importa assim atuar o mais rapidamente possível, quer ao nível da prevenção, quer no tratamento, adequado e atempado.
Importa referir também que, apesar do aumento contínuo do Orçamento do Estado para a Saúde nos últimos anos, o peso relativo ao investimento relacionado com a doença renal crónica do Serviço Nacional de Saúde (SNS) tem vindo a diminuir. Em 2024, o financiamento do Programa Orçamental da Saúde aumentou em 1209 milhões de euros (9,8%) face a 2023, totalizando 13.505,7 milhões de euros. No entanto e de acordo com o relatório da ERS, o investimento público na diálise aumentou 0,23% em 2024porque houve mais doentes.
Estes dados sugerem que, apesar do aumento nominal do orçamento, a fatia destinada à doença renal crónica e outras patologias crónicas diminuiu proporcionalmente. Claramente as entidades privadas continuam a fazer mais com o mesmo.
Hoje, cerca de 13 mil doentes portugueses fazem hemodiálise em unidades privadas (91%) e em hospitais públicos (9%). Parceiras de excelência do SNS, as clínicas privadas de diálise têm prestado um serviço inestimável e apresentando resultados médios superiores às metas propostas pela própria Direção-Geral da Saúde (DGS). Em 2023, e de acordo com o relatório da ERS, praticamente todos os valores médios globais superaram os dos objetivos estabelecidos pela DGS, com cinco indicadores totalmente cumpridos (100%) em todas as unidades de diálise. Algo que deve orgulhar os intervenientes do sector, públicos e privados.
O preço convencionado entre o Estado e as unidades privadas de diálise não é atualizado há 18 anos
E mesmo considerando que o preço convencionado entre o Estado e as unidades privadas de diálise não é atualizado há 18 anos, as associadas da Anadial continuam a apostar na qualidade no serviço prestado e numa relevante cobertura nacional. Segundo o relatório da ERS, 69% dos utentes realizam tratamentos muitas vezes três vezes por semana na unidade mais próxima da sua residência e, em 2023, o tempo médio de deslocação é de 16 minutos, uma redução de cerca de dois minutos face ao ano anterior e abaixo da média europeia.
O aumento dos encargos registado resulta exclusivamente do crescimento do número de doentes tratados, consequência natural do envelhecimento da população e da maior prevalência da Doença Renal Crónica, cujos doentes vivem mais tempo e em melhores condições. Mesmo perante este cenário e com preços regulados que não acompanham as condicionantes económicas, como é o caso da inflação ou do aumento dos custos básicos operacionais, o esforço levado a cabo pelas clínicas no sentido de responder eficazmente e com elevados padrões de qualidade é de louvar.
É importante reforçar que, sem uma diálise de qualidade, o desfecho poderia ser fatal para os milhares doentes portugueses.
Neste âmbito, a Anadial, que este ano comemora 40 anos e representa atualmente cerca de 91% dos tratamentos em hemodiálise em Portugal, reitera o seu compromisso com a qualidade, a acessibilidade e a dignidade dos cuidados prestados. Ao longo da sua existência a associação tem vindo a desenvolver um conjunto de iniciativas de sensibilização para com a doença renal crónica e promovido o debate sobre a sustentabilidade do sistema de hemodiálise.
Em 2025 a associação levou a cabo junto da população portuguesa um estudo intitulado A Doença Renal e a Diálise em Portugal e as principais conclusões são esclarecedoras: 74% dos portugueses reconhecem que a doença renal crónica tem um impacto muito significativo na qualidade de vida dos doentes e 8 em cada 10 consideram que o Estado deveria ter um papel mais interventivo no apoio às entidades privadas que prestam estes cuidados. É assim fundamental que o debate público sobre a hemodiálise continue, seja mais transparente e objetivo e tenha como ponto de partida a empatia: não falamos de custos, falamos de pessoas e famílias. E cada minuto de vida ganho graças a uma diálise de qualidade não tem preço.
António Neves, Secretário-Geral da ANADIAL
Publicado, a 21 de agosto de 2025, em: Não são números, são pessoas que necessitam de hemodiálise para viver